Sábado, 20 de Abril de 2024

O samba das cores

05/03/2018 as 20:02 | Fernandópolis | Sérgio Piva
O ano começou. Acabou o carnaval e, pasmem, não se alongou em Salvador, mas em São Paulo. Será que é uma consequência do aquecimento Global? Deve ser, porque a Globo não falou em outra coisa até terminar o mês de fevereiro.

Janeiro, como já disse o José Simão, “é o mês da árvore símbolo do Brasil, o ipê: IPÊva, IPÊtu, IPÊi e IPÊRTENSÃO! De tanta conta pra pagar”. E Fevereiro é o mês do samba, quando o trabalhador tem que sambar para pagar o restante das contas com o dinheiro que sobrou. Se é que sobrou.

Os economistas dizem que trabalhamos até maio só para pagar impostos. Este ano, se eu pagar até dezembro já vai estar de bom tamanho. Até porque, o ano só começará, na prática, em novembro. Fevereiro é carnaval, teve festa o mês todo no país, abril tem páscoa, mais gasto com ovos de chocolate, agora no cartão de crédito. Ela será no dia primeiro. Talvez, por isso, até pareça mentira os preços dos ovos que já estão dependurados nos supermercados. Só Jesus na causa.

Maio, por aqui, tem “Expo”. O comércio vende roupas e botas a botão, no crediário. Depois, para receber, pulam mais que peão em cima do touro. Mas, nessa altura, do tombo do campeonato de montarias, é tarde, porque começou a Copa do Mundo, e vem mais festa, e despesas com cerveja e churrasco.

Findo o campeonato mundial, se chorei ou se sorri, o importante é que mais dívidas eu fiz. Quem sabe algum candidato não me ajude com as contas da água e da luz, talvez um botijão de gás, pois nessa altura do campeonato político, a corrida eleitoral já começou. Tem inicio as partidas dos partidos, que em parte estão inteiros, outros inteiramente, e realmente, partidos.

Diante disso, seria mais adequado atribuirmos outras cores aos meses, em substituição àquelas apregoadas pelas instituições disso ou daquilo, em favor da divulgação de campanhas de todos os tipos.

Se bem me lembro, outubro foi o primeiro mês a ser colorido. Rosa, alertando às mulheres sobre a prevenção do câncer de mama. Como o homem não gosta de perder (e acaba perdendo sem gostar mesmo), criaram o novembro azul para satisfazer o ego dos machos e, quem sabe, satisfazer outras necessidades de outros. Não se iluda, necessidade aqui se refere àquela de cuidar da saúde.

A ordem cronológica da invenção colorida, não sei dizer qual foi, só sei que surgiram setembro amarelo, agosto dourado, janeiro branco, maio (também) amarelo, setembro verde, e outras tantas cores que faltaram meses.

Na moda já quase desmodada dos livros de colorir, proponho pintarmos os meses com cores diferentes, cada um pintando seu próprio calendário, deixando mais próximo o significado do significante.

Apesar da individualidade do registro autoral calendariano, faço algumas sugestões para as pessoas com um lápis na mão e nenhuma ideia na cabeça. Janeiro poderia ser tingido de verde. Sempre temos esperança de um ano melhor, de uma barriga menor ou de um prêmio da loteria, sem ao menos apostar em um bilhete ou em nossa própria confiança.

Fevereiro, ainda que possa ser lembrado pela alegria desfilante do carnaval, aproxima-se muito mais da cor preta, assim como a situação financeira de nós brasileiros, com tantos ipês da espécie tributus eternus, todos já cortados, processados e transformados em papeis do tipo carnê-boletos.

Março pode ser pintado de vermelho, porque, certamente, é a cor do saldo do povo, agarrado pelos tentáculos governamentais, e tais. Abril combina com o marrom da boca lambuzada do chocolate. Maio é mesmo amarelo, como ficamos depois dos sucessivos sustos dos gastos que oscilam entre o inevitável e o saboroso.

Daqui para frente o calendário será verde e amarelo. Quem sabe se não vermelho de raiva do Brasil seleção ou com a mesma cor da cara de besta como quem sai do espetáculo de um circo quimérico e descobre que o pão também é fictício.

Os meses que se seguirão poderão continuar no verde e amarelo, da esperança simulada de mudança na dança de cadeiras e das caras amarelo-peroba de quem reza a mesma ladainha do quatrilho.

Esperemos que o próximo janeiro não seja de cor preta, resultado dos resultados não esperados, ou desesperados, do significado e significante de quem deixou de ter esperança.

Quis um texto engraçado, mas como todo palhaço que sai do palco iluminado e caminha para a coxia deixa seu sorriso na ribalta, a crônica construiu-se no caminhar dos camarins da consciência.

Sobrou, contudo, a ciência: as cores são formadas pela ausência, refletem de dentro para fora. Dessa forma, nos formamos, de qualquer forma.

Antes de qualquer mês se completar, caminham-se os dias, um por um, um passo por vez. Ainda que não saibamos sambar, é crucial aprender. Você eu não sei, mas eu vim de lá pequenininho e alguém me avisou pra pisar nesse chão devagarinho. E não nego a raça, torno toda manhã dia de graça.

Sérgio Piva

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