Terça, 16 de Abril de 2024

Julgamento de homicídios demoram 10 vezes mais do que permitido

18/12/2014 as 00:00 | Brasil | Da Redaçao
Processos judicias de homicídios dolosos demoram, em média, até dez vezes mais do que prevê a legislação.

O dado faz parte de um estudo feito a pedido do Ministério da Justiça em cinco capitais: Belo Horizonte, Recife, Porto Alegre, Goiânia e Belém. A pesquisa é uma das atividades relativas aos dez anos da emenda constitucional da reforma do Judiciário, que são completados neste mês de dezembro. O GLOBO teve acesso ao levantamento com exclusividade.

O Código de Processo Penal estabelece que o prazo para a conclusão dos processos deveria ser de 315 dias. O estudo analisou 786 processos concluídos no ano de 2013. Em Belo Horizonte, os processos demoraram, em média, 3.403 dias para serem concluídos, quase dez anos. Das capitais pesquisadas, em Porto Alegre acontece a tramitação mais célere, 2.058 dias. Mesmo assim, o número é mais de seis vezes superior ao tempo previsto na legislação. Os números de Goiânia (3.034 dias), Recife (2.605) e Belém (2.269 dias) também extrapolam muito o prazo legal.

Foi feito também o cálculo ignorando os processos que tiveram maior e menor duração para se obter a mediana do tempo gasto. Nesse critério, Belo Horizonte manteve o posto de cidade com a maior demora, com 2.019 dias. Na sequência aparecem Goiânia (1.558), Recife (1.488), Porto Alegre (1.232) e Belém (1.098).

A pesquisa traz ainda informações sobre o perfil dos réus e vítimas. Em mais de 70% dos casos a vítima conhecia o algoz. O número de crimes praticados com arma de fogo superou 60% e em 59% dos processos analisados o homicídio ocorreu em via pública. O levantamento mostra ainda que 79% dos autores do crime e 53% das vítimas tinham entre 18 e 35 anos.

O secretário de Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça, Flávio Caetano, afirma que a pesquisa deve subsidiar políticas públicas. Ele sugere o investimento em políticas de mediação de conflitos, maior integração entre as polícias e a criação de uma câmara de monitoramento de processos de homicídios que una Judiciário, Ministério Público e os governos para que o acompanhamento dos casos seja feito de forma coordenada. A demora para conclusão dos processos, na sua visão, estimula a prática de crimes.

— Demorar dez anos para julgar um homicídio gera sensação de impunidade e de insegurança e sabemos que a impunidade incentiva o crime — disse ao GLOBO.

Os prazos são estourados em todas as fases. Os pesquisadores observaram que em 80% dos casos analisados o inquérito não foi instaurado mediante flagrante, mas por portaria, o que indica que a “descoberta do crime” não ocorreu de forma imediata. A previsão legal de se concluir inquéritos policiais em 30 dias não é cumprida em nenhuma das cidades, com a média variando de 147 dias em Belém a 700 dias em Belo Horizonte. O Ministério Público também não cumpre o prazo previsto para o oferecimento de denúncias. Em vez dos 15 dias previstos na legislação, o prazo médio varia de 65 dias em Recife a 197 dias em Porto Alegre.

É no Judiciário, porém, que os prazos passam a ser contados em anos. O CPP prevê até nove meses para que seja feita a instrução processual, o julgamento pelo tribunal de júri e a análise dos recursos. Na capital pesquisada em que foi registrado o melhor resultado, Porto Alegre, o prazo médio é quatro vezes maior: três anos e meio. Em Belém, o tempo de duração é de cinco anos e um mês. Em Recife, pouco mais de seis anos. Em Belo Horizonte, são mais de sete anos, enquanto em Goiânia o prazo médio é de sete anos e três meses.

O secretário da reforma do Judiciário observa que boa parte do tempo é consumido para a marcação do júri, três anos, em média. Ele sugere que sejam implantados “mutirões de júri”, para acelerar o processo. Observa ainda que o CPP já prevê punição para descumprimentos de prazos nas diferentes fases do processo, mas que elas nunca são devidamente aplicadas. Defende que o novo CPP em debate no Congresso Nacional busque medidas para efetivar a diminuição de prazos. Sugere como alternativa a figura do juiz de instrução, que acompanharia o trabalho da polícia e do MP eliminando a necessidade de nova produção de provas na fase judicial do processo.
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